Para começar, gostaria de
explicar para você que não é muito habituado a ouvir esse termo “ecumenismo” e
se é muitas vezes de maneira equivocada ou preconceituosa (ou os dois) á
respeito do assunto, vejamos então:
- 1. O termo “ecumene” se deriva do grego “oikoumene”, que significa “habitada”, subentendendo-se tratar da “terra”. Portanto “oikoumene” designa a terra habitada. Na raiz está à palavra “oikos” (casa). Diz respeito á nossa “casa” que é o mundo, no qual habitamos. O sentido original de “ecumene” é de ordem geográfica, referindo-se ao espaço de vida do ser humano. É assim que aparece no A.T grego (Sl 24.1) e sobretudo no N.T (Lc 4.5; At 11.28; Rm 10.18; etc)
- 2. Na perspectiva cultural o mundo unido pelo helenismo, sendo que para a primeira cristandade a ecumene passa a ser vista para o campo de sua missão (Mt. 24.14). Muito em breve, porém, o adjetivo “ecumênico” seria aplicado á própria Igreja, difundida por toda a terra. Torna-se sinônimo de “Igreja toda”, isto é, “católica”, de “Igreja inteira”, “Igreja Universal”. O termo adquire significado eclesiológico.
- 3. Adquire uma determinada mentalidade, a saber, a da consciência da unidade em Cristo e por isso a de abertura e amplitude. Ecumene ultrapassa as fronteiras de uma instituição. Tem em vista o corpo de Cristo em sua integralidade, nos horizontes de toda a “terra habitada”. Possui proximidade ao que hoje se chama “global”.
Portanto vejamos que o termo
ecumenismo não tem origem em tempos modernos, como muitos pensam, mas sim em um
pensamento helenístico incorporado pela tradição judaica-cristã, especialmente
no pensamento e na teologia do apóstolo Paulo.
Há muitas divergências entre as
contribuições de Paulo ao pensamento cristão, alguns o consideram fomentador de
uma teologia eclesiástica que se distanciou, devido a institucionalização do
movimento cristão, da mensagem de Jesus, tentando solucionar problemas
institucionais, interpretando a mensagem de Yeshua
com acréscimos pessoais juntamente com suas influencias (influencia do
pensamento helenístico e judaico), outros dizem que ele contribui de forma positiva
para a formação de uma teologia que pudesse solucionar os problemas da época e
fomentar doutrinas interpretativas a respeito daquilo que Cristo falou,
orientando a Eclésia (Igreja).
Divergências á parte, gostaria de
focar naquilo que achei interessante, primordial e bem elaborado na teologia
paulina, a saber, o seu pensamento ecumênico, propostas ecumênicas, e as
doutrinas que direcionam a igreja para uma união em sua casa.
1.
Sois um só em Cristo Jesus:
Teologia do Batismo.
O batismo, mencionado em inúmero textos do escritos paulinos se liga
diretamente á unidade em Cristo. Para superar a descriminação por parte do
leitor gostaria de citar um texto: “Todos vós, que fostes batizados em Cristo,
vos vestistes de Cristo. Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não
homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gálatas 3,28).
Essa atitude cristã de superar antagonismos tende a se estender universalmente. Podemos pensar que o espírito cristão leva a
unificar e a superar os preconceitos e as discriminações e a ver os outros
solidariamente, inclusive, paritariamente, em comunhão e unidade. Por causa da
unificadora vontade salvífica de Cristo ou a partir de Cristo e seu Espírito. O
Batismo é um só. O Batismo une a todos os cristãos, pois ele não é institucional,
mas sim um sinal de entrega á vontade de Jesus.
2.
Não haja divisões entre vós! Exortação de Paulo á unidade e á concórdia: “Eu vos exorto, irmãos,
em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, guardai a concórdia uns com os outros, de
modo não haja divisões entre vós. Sede estreitamente unidos no mesmo espírito e
no mesmo modo de pensar. Com efeito, meus irmãos, pessoas da casa de Clóe me
informaram de que existe rixas entre vós. Explico-me: cada um de vós diz: ‘Eu
sou de Paulo!’, ou ‘Eu sou de Apolo!’, ou ‘Eu sou de Cristo!’ Cristo estaria
assim dividido? (1 Coríntios 1,10 – 13). O ecumenismo quer superar discórdias,
rixas e divisões, quaisquer que sejam as suas causas, tendo em vista a unidade
de Cristo. Cristo é o mesmo salvador de todos.
3.
A vocação a que fostes chamados. Vocação Cristã: “Exorto-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor,a
andardes de modo digno de vocação a que fostes chamados: com toda a humildade e
mansidão, com longanimidade, suportando – vos uns aos outros com amor,
procurando conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Efésios 4,
1-3) desse modo, é mantendo a unidade que se realiza a vocação cristã. O
ecumenismo, por sua vez, visa ao cumprimento da vocação cristã.
4.
Ceia ou Eucaristia*: “o cálice da benção, que
abençoamos, não é comunhão com o sangue de cristo? O pão que partimos, não é
comunhão com o corpo de Cristo? Já que há um único pão, nós, embora muitos,
somos um só corpo, visto que todos participamos desse único pão” (I coríntios
10, 16-17). O Apóstolo Paulo vê no pão compartilhado um fundamento da unidade
do corpo de Cristo, ao qual pertencemos.
5.
Unidade com diversidade, pelo
mesmo Espírito. Corpo de Cristo: “...com o fim de
preparar os santos para a obra do ministério, para que o corpo de cristo seja
edificado, até que alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de
Deus, e cheguemos á maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo”
(Efésios 4, 12- 16) “Com efeito, o corpo é um e, não obstante, tem muitos
membros, mas todos os membros do corpo, apesar de serem muitos, formam um só
corpo. Assim também acontece com Cristo” (I Co 12,12). Paulo usa a imagem do
corpo e nos faz pensar na relação da unidade com diversidade. É importante no
campo ecumênico, falar de unidade e diversidade, de identidade e de alteridade,
de diferenças que se respeitam e que se somam.
6.
Unidade da reconciliação e da paz. “Ele é a nossa paz: de ambos os
povos fez um só, tendo derrubado o muro da separação e suprimido em sua carne e
inimizade, [...] a fim de criar um só Homem Novo, e de reconciliar a ambos com
Deus em um só corpo, por meio da Cruz”. “aprouve a Deus fazer habitar toda a
Plenitude e reconciliar por ele e para ele todos os seres, os da terra e os dos
céus, realizando a paz pelo sangue de sua cruz.” (Colossenses 1, 20-22). A
reconciliação reúne a união de todos os povos e pessoas (não no sentido de
conversão, mas sim de comunhão de fato). O ecumenismo deriva do espírito de
reconciliação com Deus. Para os cristãos, a paz é dom de reconciliação, também
com o perdão, um estado de novo ser, nova vida e nova relação. A paz é
aspiração de todas as religiões
7.
Caridade ou Amor: “ a caridade é a plenitude de
toda á Lei” (Rm 13, 10) “Revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição”
(Colossenses 3,14) “ o Amor de Cristo nos impele” (2 Co 5,14) Seria impossível
que o ecumenismo ficasse surdo a tanta insistência na caridade. O objetivo do
ecumenismo é promover a unidade na caridade.
8.
Justificação pela Fé: (Gálatas 3,11; Rm 1,16-17) Você
poderia me dizer que esse é um tema divergente entre Protestantes e Católicos,
mas eu lhe venho com boas novas, a partir do evento da Declaração Comum sobre a
Doutrina da Justificação entre Católicos e Luteranos em 1999, temos um só credo
(Lutero Wins) a saber:
“Confessamos juntos:
somente por graça, na fé na obra salvífica de Cristo,
E não por causa do
nosso mérito, somos aceitos por Deus e recebemos o
Espirito Santo, que nos
renova os corações e nos capacita e chama para as boas obras!”
Declaração
conjunta sobre a Doutrina da Justificação, Augsburgo, 31 de outubro de 1999.
Uma
contribuição ecumênica para um assunto ecumênico.
Enfim, poderia citar dezenas de
textos nos quais Paulo se remete a um pensamento ecumênico, gerador de união.
Não queremos aqui tratar ecumenismo, com infantilidade preconceituosa, é
interessante dizer, que pelo fato dos cristãos se unir, não necessariamente
abrirão mão de suas convicções doutrinárias ou suas identidades institucionais,
mas deverão reconhecer que de fato, aquilo que nos une é maior que aquilo que
nos separa. Estamos unidos em Cristo e ele é a cabeça, essas são nossas raízes
de fé. O mundo mais do que nunca, necessita de uma união Cristã para o serviço
em prol dessa grande terra habitada. Temos muito a contribuir, cabe a nós
escolher se iremos ficar dentro de nossos redutos denominacionais em nome de
nossas “verdades absolutas” e nossas liturgias de fé, ou se iremos nos unir,
cumprindo a vontade de Jesus, em "serviço e amor" bem expressa na teologia do Apóstolo Paulo.
“Há um só Corpo e um só Espírito,
assim como é uma só a esperança da vocação a que fostes chamados; há um só
Senhor, uma só fé, um só batismo; há um só Deus e Pai de Todos, que está acima
de todos, por meio de todos e em todos” Palavras de Paulo
na Carta aos Efésios. Ef 4,4-6.
*Paulo não introduziu nem inventou
o rito do batismo e nem a ceia. Recebeu esses conceitos e imagens do judaísmo e
do helenismo e tratou deles de modo cristão.
Referências Bibliográficas:
·
Maria
Teresa Cardoso de Freitas – Paulo e o Ecumenismo. Revista do Departamento de
Teologia da PUC – Rio/Brasil.
·
BRAKEMEIER,
GOTTFRIED. Preservando a unidade do Espirito no Vínculo da Paz. São Paulo,
2004. ASTE
RODRIGO DE BARROS
MASCARENHAS