Todos os dias
bem cedo, o galo acordava, ainda escuro, e anunciava solene aos seus
companheiros:
“ _ Vou cantar para fazer o sol nascer...”
E se
empoleirava no alto do telhado, olhava para o horizonte, e ordenava,
categórico:
“_ Co-co-ri-co-có...”
Dali a pouco a
bola vermelha mostrava o seu primeiro pedaço e o galo comentava, confidante:
“ _ Eu não
disse?...”
E os bichos
ficavam boquiabertos e respeitosos ante poder tão extraordinário conferido ao
galo: cantar pra fazer o sol nascer. E nem havia alguma sombra de dúvida,
porque tinha sido sempre assim, com o galo-pai, com o galo-avô...
Aconteceu,
entretanto, que o galo certo dia perdeu a hora, e quando ele acordou o sol já
estava lá, brilhando no meio do céu.
Assim se acham
a grande maioria dos teólogos, cristãos, evangélicos ou católicos. Detentores
da verdade absoluta, como se fizessem de Deus seu escravo, e sendo assim, ditassem o ritmo daquilo que está além de todos nós. O Sol nasce independentemente do que acreditamos ou não. Tentar descobrir e explicar Deus é loucura, teologia
é feita para nós mesmos, é nossas explicações daquilo que achamos acreditar, é
o canto da nossa alma, buscando Deus, de quem estamos com saudades. Contudo, confundimos o sentimento, e certos de que já achamos, impomos aquilo cremos,
como galos inquisidores, e amordaçamos, ferimos e expurgamos outros galos que
tentam pensar de outra forma. Enfim, esse Deus que projetamos se parece muito com
nós mesmos, diz que ama incondicionalmente, mas nos envia para o inferno, deu a
sua vida por nós, mas espera em troca da salvação que renunciemos a nossa vida
por causa dele, e no fim, buscamos motivos nobres e explicações bem arranjadas
para justificarmos essas discrepâncias. Bobagem. É o nosso reflexo se
manifestando, é o nosso desejo por transcendência que nos faz cometer as
maiores loucuras, em nome de um Ser Superior. Se Deus de fato existe, ele está além de
nossas tramas verbais e o que fazemos é brincar com as palavras, mas levando
isso tão á sério que acreditamos que nossas verdades indicam uma trama com
consequências cósmicas e tremendas. Loucura. Tenho saudades de Deus, e isso me
basta.
Teologia,
Celebração de
um vazio que nada pode encher.
É só por isso
que dizemos que Deus é infinito.
Não porque o
tivéssemos medido,
Mas porque sentimos o Infinito do desejo
Que coisa
alguma pode satisfazer.
Daí que
estamos condenados a ser eternos pranteadores
Mas teologia
é coisa bela, um Sonho.
Aprendi lendo as sagradas Escrituras, onde
está interditado o simples – pronunciar o nome do Sagrado, que sempre que aparecia
no texto era substituído – por um outro Tabu!- e, se o simples pronunciar do
nome sagrado era blasfêmia, que dizer das tentativas de se escrever anatomias e
fisiologias dos Mistério Divino, isto a que se dá o nome de Teologia?
Minha teologia nada tem a ver com teologia
É vicio.
Há muito que
deveria ter abandonado esse nome.
E dizer só,
poesia, ficção.
Descansem os
que têm certezas.
Não entro no
seu mundo e nem desejo entrar.
Jardins de
concreto me causam medo.
Prefiro a
sombra dos bosques
E o fundo dos
mares,
Lugares onde
se sonha...
Ali mora os
mistérios
E o meu corpo
fica facinado.
Rubem Alves *
O sol nasce
sempre, do mesmo jeito; com galo ou sem galo.
Por Rodrigo de Barros Mascarenhas
*TODAS as palavras em itálico de Rubem Alves,
retirado do prefácio do livro “Por uma teologia da Libertação” (Fonte
Editorial).
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