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segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Entrevista com Madihah, uma sobrevivente da chacina de Jericó- Parte 2


1. Esta é a segunda parte da entrevista com Madihah, uma sobrevivente da chacina realizada por Israel, liderada por Josué, a Jericó. Ela conta, condensadamente, algumas das principais coisas que ocorreram naquele dia, de muito choro e sofrimento. Leia, e tente perceber o sentido real dessas palavras, pois foi aquilo que esta pobre mulher vivenciou.


"Gritou, pois, o povo, tocando os sacerdotes as buzinas; e sucedeu que, ouvindo o povo o sonido da buzina, gritou o povo com grande brado; e o muro caiu abaixo, e o povo subiu à cidade, cada um em frente de si, e tomaram a cidade. E tudo o quanto havia na cidade destruíram completamente ao fio da espada, desde o homem até à mulher, desde a criança até aos idosos, e até ao boi e ao bezerro, e ao jumento". Josué 6.20-21



-[silêncio sepulcral por ininterruptos 3 minutos...]

-Madihah, toma um copo com água, far-te-á bem... Daí, continuaremos a entrevista. 

-Vou ficar bem, é que esta parte da história me causa espanto, sinto-me como se estivesse lá, naquele dia, naquele lugar... Lembro-me dos sons, penetrando minha mente, das muitas vozes que não me saem da cabeça, dos bastantes barulhos os quais não me abandonam, até quando me deito, eles estão aqui, comigo. As imagens parecem tão nítidas, tão vivas, mas carregam tanta sombra e tristeza. 

-Imagino, deve ser terrível para ti, não é uma situação confortável, não mesmo. Não desejo para ninguém, viver aquilo que tu viveste. 

-Mas quero continuar... Quando conto para alguém, aquilo que nos ocorreu naquele dia de sangue, sinto-me repartindo meu fardo, meu sofrimento, mesmo sabendo que não viverei o suficiente para exauri-lo. 

-Pois bem Madihah, fala-nos tudo o que o teu coração suportar dizer...

-Como disse, eu ouvi, no momento em que meu marido se virou, e nos confortou com suas palavras encorajadoras, um estrondo assustador, alarmando-nos mais, extremamente terrível. Tremeu-nos as paredes e os corações. Não conseguia entender, de fato, o que acontecia. Minha mente estava perturbada, estupefata, não havia espaço para o raciocínio mais lógico e simples possível. Como falei, não queria acreditar...

-Percebi que começaram a cair alguns pedacinhos de barro de nosso teto, e as madeiras que meu esposo colocara na porta se moviam. Foi quando abruptamente notei, com espanto ainda maior, que havia soldados israelitas em nossa porta, tentando derrubá-la, tentando removê-la de seu lugar, sem que lhes houvéssemos feito absolutamente nada. Bradavam que a terra era deles, gritavam a nossa porta: abram malditos cananeus, esmagaremos suas vísceras e anatematizaremos a Yaveh tudo o que lhes são possessões. 

-Meu esposo se lançou à porta, estendeu suas mãos, e objetivou reforçar a proteção das madeiras, com sua força e peso do corpo. Ele transpirava muito e, em todo momento, suplicava o favor de El Shaddai, nosso deus. No entanto, ele estava com medo, podia percebê-lo em seus olhos, enquanto virava rapidamente sua cabeça para nos olhar, passando sua mão na testa para remover as gotas do esforço pela nossa sobrevivência. Pobre de meu amado, lutou com todos os recursos que tinha, pela vida daqueles que mais amava [respiração lentamente acelerada, tórax visivelmente movimentado no enchimento pelo ar do lamento]. 

-Ele notou que as madeiras não suportariam, quebravam-se, a porta não fora criada para suportar tanta fúria alheia, virou-se com as pupilas sobressaltadas, e nos disse: haja o que houver, aconteça o que acontecer, sempre lhes amarei. Ao terminar suas palavras, comecei a chorar, não resisti a paixão daquele sofrimento, Amber e Leena já derramavam lágrimas de pavor há muito. Amber gritava desesperada, instintivamente sabia que algo não andava bem. Leena tremia seu corpo frágil de oito anos, eu sentia suas mãos suarem no meu vestido, e o calor medroso de seu hálito em meu rosto reclamando-me: mamãe, mamãe, estou com medo, mamãe, diga-me o que está acontecendo, mamãe...

-A senhora disse que Leena não sabia o que acontecia ainda, por quê? 

-Sim. Esqueci-me de mencionar que Leena era especial. Não enxergava a cor das rosas e o brilho das estrelas desde que nasceu.

-Isto quer dizer que Leena tinha dificuldades visuais? 

-Sim, isto mesmo. Justamente, por tal motivo, ela ficou o tempo todo agarrada ao meu vestido. Direcionava-se por mim, movia-se, de um lado para o outro, sempre dessa forma. Não tinha capacidade de ir e nem de vir sozinha. Eu e meu esposo cuidávamos dela, muito mesmo. Amávamos Leena,... [momento sensível, pranto acentuadamente crescente, soluço e aperto raivoso de um pano]. Era especial, sempre será a mim. 

-Estou chocado...Conta-me um pouco sobre Leena.

-Leena? Ah, o que posso dizer a respeito... Ela era tão linda [voz trêmula]... Cabelos onduladamente castanhos, olhos chorosos de ternura, vagantes à procura das vozes que seus ouvidos conseguiam escutar, doçura procedia deles. Seu rosto era sensível, bochechas discretamente rosadas, lábios afinados, como que feitos por mãos de El. Dentes incompletamente serenos. Seu sorriso, ah, seu sorriso era alegre, transmitia inocência e esperança. Pernas e braços finos de molecota [...] Não posso falar mais sobre ela, meu coração não aguentará se eu continuar. 

-Tudo bem Madihah, retoma o caso da invasão de seu domicílio, não quero que esta entrevista se transforme em uma acentuação de teu fardo...

-Está bem... Não me recordo onde parei.

-Quando teu marido tentava obstruir a invasão dos israelitas, e vos disse palavras confortadoras...

-Ah, sim. Então, depois que ele me disse: haja o que houver, aconteça o que acontecer, sempre lhes amarei, uma tocha altamente inflamada entrou por uma fissura que se abrira no alto da porta já enfraquecida. Ela voou, resvalou na seda central que deixávamos amarrada do alto do teto ao chão, o qual servia para enfeitar o espaço principal de nosso lar, e parou ao lado da tábua de utensílios de barro a qual estávamos. Com uma fumaça sufocante, cheia de panos amarrados a um caniço longo repleto de óleo. Meu esposo gritou: Madihah, saia daí, pegue as crianças e corra para o terreiro ao fundo. Eu, desesperada, com Amber e Leena para cuidar, não sabia o que fazer. A chama da tocha pegou em alguns panos que guardávamos por perto, e acendeu uma fogueira que já não podia mais ser detida, bem do nosso lado. Minha visão ficou opaca, fui me levantar, apoiando-me na tábua, com Amber na outra mão, e acabei virando os utensílios de barro no chão. Meu pecado, meu erro. Um deles caiu e se espatifou, voaram cacos e mais cacos por todos os lados. Leena teve suas pernas e pés arranhados, pelos estilhaços. 

-Ao me levantar, e ao mover-me para a porta dos fundos de casa, buscando sair correndo com as crianças, para tentar, de alguma forma, livrá-las daquela situação, ouvi a porta da frente sendo totalmente destruída pelas espadas desembainhadas que a batiam. Parei, e não nitidamente, por causa da fumaça, presenciei quatro soldados israelitas, chutando os pedaços de madeira que ainda restavam na parte de baixo, porém, um já conseguira ultrapassar o limite de proteção que nos restava. Meu marido, nesse momento, estava de frente com aquele soldado. Kalih não era guerreiro, era um simples agricultor, que cuidava de nossa vinha, a fim de garantir a sua família o pão do sustento cotidiano. Não era preparado para nenhuma batalha, ainda que não velho. 

-Nunca me esquecerei da cena que iria presenciar...

Continua...

André Francisco

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