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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Joãozinho Gay



Joãozinho era Gay e todos sabiam. Desde pequeno, demonstrava certo tipo de comportamento “diferente” dos outros garotos. Era amigo das meninas, não brincava de carro, de polícia e ladrão, não jogava bola. Seu lugar preferido era grudado na barra da saia da mãe e sentado com suas primas, quando essas o vinham visitar nos feriados, brincando com suas bonecas e fazendo penteados exóticos. Todas as pessoas o achavam lindo e fofo, pois era sensível e extremamente educado, mas ao mesmo tempo o olhavam meio que surpresos, pois seu comportamento era muito diferente do que se esperava de um garoto “normal”, como tudo deveria ser. Contudo, ninguém ousava arriscar um comentário, sua mãe, muito temperamental, não aceitava que falassem de seu querido Filho, logo gritava aos berros “quem cuida desse garoto sou eu, não ouse dar pitaco”.

Joãozinho cresceu e sua família, bastante religiosa, sempre levava o rapaz todos os sábados e domingos na igreja, nos cultos da mocidade e de celebração do dia do Senhor. Certo dia na escola, Joãozinho começa a trocar olhares com um menino de sua classe e assim permaneceu por horas, enquanto sua professora permanecia falando sobre biologia e a teoria da evolução. Sentiu-se fascinado pelo rapaz. Suas curvas, seu cheiro, seus cabelos negros, seu jeito simples e modesto e seu desajeitado sorriso que o fazia ir ás nuvens. Seus colegas logo começaram a perceber que de fato Joãozinho parecia muito estranho e seu comportamento era muito diferente. No recreio, todos iam para o pátio, jogar bola e brincar de lutinha, enquanto Joãozinho ficava no parque com as meninas, conversando assuntos de moda, beleza e penteando seus cabelos, o que elas adoravam. Logo começaram os apelidos, os xingamentos e as investidas dos meninos mais fortes da classe contra Joãozinho. Riam de sua cara, o chamavam de “bichinha” e diziam que ele era uma aberração da natureza. As meninas sempre protegiam o pobre rapaz, pois o amavam, era um ótimo amigo, tinham um bom coração e as fazia rir incessantemente, além de estar sempre de bom humor. Certo dia, Joãozinho foi pego no banheiro da escola, tentando beijar aquela sua paixonite da turma e logo deu se um alarde geral.

Seus pais foram chamados na escola e a situação foi dita. Ele não poderia estudar mais ali, era um episódio irremediável, e a escola de tradição protestante clássica, não admitia tal comportamento. Foram os dois expulsos e Joãozinho tomou uma surra, daquelas bem dadas de seu pai, com a cinta de couro, para aprender a se comportar como “homem”. Sua mãe lhe disse que era muito errado aquele tipo de comportamento e que ele não deveria jogar o nome de sua família no lixo e o levou para o pastor da igreja, para que pudesse orar pelo rapaz e aconselhar a tomar uma postura. O pastor que também era psicólogo se dispôs a tratar espiritualmente e psicologicamente daquele adolescente, a fim de transformar seu comportamento e mudar seu destino. Assim ele dizia para a mãe de Joãozinho, “esse mal tem cura, ainda mais que foi descoberto cedo, a senhora não precisa se preocupar”.

Joãozinho se sentia como se fosse à pior criatura do mundo, sem amigos, longe de sua escola favorita, olhado com desconfiança por todos e culpado por sentir que havia causado uma vergonha enorme aos seus pais, vivia seus dias, se dedicando ao que gostava de fazer, pintar em telas médias com tinta guache, desenhando look’s femininos e cortes de cabelo masculinos. Era quase um artista mirim. O que Joãozinho não conseguia entender era porque ele não conseguia se livrar daquele suposto mal que de todos falavam que ele possuía. Não entendia de onde tinha surgido e o porquê sentia atração física e emocional por aquele colega, que até hoje não havia esquecido.

Quando completara 18 anos, Joãozinho ainda era um homossexual enrustido. Sentia ainda todos os desejos que sentira dentro daquela sala, olhando para seu colega, contudo tinha que constantemente disfarçar seus trejeitos e suas vontades e paixões, pela pressão social dos mais machistas e a orientação religiosa de sua família. Ia ainda à igreja todos os finais de semana, mas se sentia um lixo, quando o pastor, ao pregar seu sermão, atacava veementemente sua sexualidade dizendo “o homossexualismo é coisa do diabo, Deus deseja libertar a sua vida através de seu filho Jesus” e então voltava para casa deprimido, sentido que havia alguma coisa de errado com ele e que sua vida era um tremendo equívoco para todos os que o cercavam, exceto para sua amigas que lhe apoiavam e o amavam.

Certo dia, Joãozinho chegou a sua casa com um rapaz, chamou os seus pais e disse “quero apresentar para vocês o meu namorado, eu o amo e gostaria de receber a permissão de meus pais para termos um relacionamento público e sério”. Ao ouvir a notícia, sua mãe começou a chorar e a gritar “meu Deus, meu Deus, o que fiz pra merecer isso?!”, enquanto seu pai, ex-militar, arrogante do jeito que era lhe virou a mão no rosto e começou a lhe chutar, gritando “vergonha, vergonha, vergonha, seu safado, honre sua família!” e seu quase namorado saiu correndo, temendo que o pior acontecesse para ele também.

No outro dia, seu pai, bastante arrependido do que fizera no dia anterior, foi até seu quarto para pedir desculpas e reconciliar-se. Quando abriu a porta, deparou com Joãozinho, morto, pendurado pelo pescoço em um lençol que estava amarrado na parte superior da barra da janela de ferro. Havia se suicidado. Em cima da cama, havia uma carta que dizia:

“Decidi que viver não era mais uma opção. Envergonhei á todos que conhecia. Meus pais, meus amigos, minha igreja e a sociedade em que vivo. Amo á todos, mas creio que nunca poderia mudar, sempre fui dessa forma, é maior do que eu mesmo. Prefiro morrer ao transformar minha vida e a vida dos que me cercam numa constante decepção. Espero que me perdoem e que Deus me aceite, como pai de amor que é.”

Mal sabia Joãozinho que ele não possuía uma doença, mas sim aqueles que diziam que o mesmo era doente. Na terra de cegos, quem tem olhos se suicida.

Rodrigo Mascarenhas


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